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Lendo o Almanaque da Folha, acabei encontrando essa coluna, do grande nome do teatro brasileiro Plínio Marcos, mas que nem sempre é reconhecido como tal. Ele não tratava de futebol e nem era corinthiano, mas escreveu esse ótimo texto no dia 5 de dezembro de 1976, no domingo em que houve a invasão dos 70 mil corinthianos no Maracanã.
São muitos os caminhos
O Coríntians tem a maior torcida do mundo. Só que a torcida do Coríntians se divide em duas facções: existem os que torcem a favor e os que torcem contra o Coríntians.
O pão do espírito é necessário
O cara que sempre pega a pior, que só come capim amargo pela raiz ou bagulho catado no chão da feira; o cara que mora na beira dos corregos e quase se afoga toda vez que chove; o cara que vê toda hora seus mais ternos sentimentos esmagados nas cruentes batalhas sem glória do seu dia-a-dia; o cara que a toda hora se sente a alegria do circo, constrangido pelas impossibilidades do seu salário miserável; esse cara abriu a boca pálido de espanto e, com a voz rouca de tanto berrar da geral sem nunca influir no resultado, murmurou baixinho:
– Este ano é nosso.
Depois gritou:
– O da gravata, suspende o sortido que eu pedi. Domingo vou no Maracanã ver nosso Coringão faturar o Flu.
E o cara sorriu, como se estivesse bem alimentado.
Uma religião não atrapalha a outra
Os ogãs, acanhados, chegaram junto à Mãe Grande de um terreiro de muita valia e o mais velho foi explicando meio encabulado:
– Olha, mãe, a gente tá sabendo que tem festa pra Iemanjá, nesse domingo… mas olha, mãe…a gente é de muita fé… mas esse domingo não vai dar pra gente ir na Praia Grande… Domingo… a senhora sabe…
E a Mãe de Santo interrompeu com toda sua compreensão:
– Tou sabendo, tou sabendo. Só que ninguém vai ficar em falta com Iemanjá. A gente vai pro Rio de Janeiro. Lá tem mar, não tem? Então. Logo cedo a gente oferece o que tem que oferecer prá Santa e depois vamos pró Maracanã torcer pelo Coringão.
O reino de Deus é dos puros
“Esse ano é do Coríntians”. E se não for, qualquer corintiano terá forças para esperar mais vinte e dois anos ou até a vida toda por um título, sem esmorecer. A glória do corintiano é ser corintiano.
Aliás, já no tempo da Bíblia, o Coringão tomava ferro. Outro dia abri a Bíblia e vi lá: Corintius I, Versículo II. E naquele tempo, Matheus não era presidente. Apenas assinava uma coluna.
Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 5 de dezembro de 1976
** Neste texto foi mantida a grafia original
1 Comentário so far
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Larissa, estou fuçando no seu blog (só fomos apresentados a pouco tempo).
Maravilhoso o texto, e naquele tempo havia mesmo essa idéia de escrecer Corinthians sem o h, pura brasileirice à toa. Aliás, até hoje, muitos grafam corintiano.
Eu não, sou CORINTHIANO, com todas as letras!!!
Abraços,
Freeman.
Comentário por José Freeman Junior novembro 11, 2008 @ 3:36 am